Otimização da gestão da água – transparência da eficiência hídrica, redução de perdas na distribuição e reutilização de águas residuais, cinzentas e pluviais.

Otimização da gestão da água – transparência da eficiência hídrica, redução de perdas na distribuição e reutilização de águas residuais, cinzentas e pluviais.

A. Objetivos

  1. Aumentar a eficiência na gestão dos recursos hídricos, de modo a tornar o país resiliente à desertificação e às alterações climáticas.
  2. Reduzir os impactos ambientais relativos à captação, distribuição e tratamento de água, em particular o consumo de energia e as descargas de águas residuais.

B. Racional

  1. Portugal está entre as zonas da Europa potencialmente mais afetadas pelas alterações climáticas, sendo que as secas e o esgotamento das reservas hídricas se tornarão, inevitavelmente, cada vez mais frequentes. De acordo com o recente relatório especial do Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas, os cenários climáticos mais gravosos para Portugal preveem que o aumento da temperatura poderá chegar a +5°C em 2100, em particular durante o Verão e no interior do país.
  2. A escassez de água já é um problema real e requer a adoção de medidas imediatas. São cada vez mais frequentes os fenómenos de seca no nosso território. As últimas quatro décadas foram as mais quentes desde 1931, tendo 8 dos 10 anos mais quentes sido verificados nos últimos 20 anos e a precipitação tem-se reduzido em cerca de 20 milímetros por década.
  3. A redução de perdas no sistema de abastecimento público assume assim particular prioridade – atualmente temos perdas de água na ordem dos 35% do total da água captada (com alguns municípios a registarem perdas reais na ordem dos 70% nos sistemas em baixa resultantes de baixos níveis de investimento na renovação da rede de distribuição).
  4. Com a crescente ameaça das secas e o défice hídrico, assume particular prioridade a reutilização de água proveniente das Estações de Tratamento de Águas Residuais para fins compatíveis com a qualidade dessa água (após o respetivo tratamento), nomeadamente para irrigação, usos urbanos e industriais, e com particular prioridade para as regiões raianas, do Alentejo e do Algarve.
    A reutilização da água deve naturalmente assegurar critérios de tratamento diferenciados para que sejam seguras em cada situação de reutilização (“fit-for- purpose”). Em particular, a reutilização de águas tratadas para fins agrícolas apenas deve ser feita após assegurar o cumprimento de elevados padrões de segurança para a saúde e ambiente. A reutilização da água permite diminuir as necessidades de captação de água, enquanto reduz as descargas de águas residuais tratadas, contribuindo assim duplamente para a melhoria do meio ambiente.
    O Ministério do Ambiente legislou recentemente sobre estas matérias, regulando a atividade de reutilização de água e estabelecendo o objetivo de que as 50 maiores ETAR do país possam vir a permitir reutilizar 10% a 20% da água residual tratada. No entanto, a disponibilização desta água é apenas um dos lados da equação. É necessário também o investimento das autarquias e poderes locais em redes de distribuição secundária que permitam a utilização desta água reciclada tanto para fins agrícolas e industriais, como para usos urbanos, como por exemplo nas regas de jardins e espaços verdes, na limpeza de ruas e pavimentos, na lavagem de frotas equipamentos e outros fins adequados, reservando assim a utilização de água potável para consumo humano.
  5. Este esforço não deve ser feito apenas no domínio público, mas também no domínio privado, onde é possível aumentar a adoção de sistemas de reutilização de águas cinzentas. As águas cinzentas constituem 50 a 80% do esgoto residencial e é toda a água residual que não a de esgoto sanitário. Esta água pode ser tratada e reaproveitada para a limpeza de pisos ou uso sanitário. Adicionalmente, também as águas pluviais podem ser aproveitadas, para os fins acima referidos, desde que não contaminadas (ou após tratamento).
  6. Portugal deve também apostar na redução do desperdício de água em todos os sectores e ao nível doméstico. No caso dos utilizadores domésticos, através da escolha de bens e equipamentos mais eficientes – o que pressupõe transparência e disponibilização de informação adequada. No caso dos utilizadores empresariais, pela adoção de melhores processos, técnicas e sistemas.

C. Proposta

  1. Promover a transparência da eficiência hídrica dos imóveis, bens e equipamentos, permitindo aos cidadãos escolhas informadas que lhes permitam reduzir o consumo de água
    1. Indicação obrigatória da classificação do nível de eficiência hídrica nos equipamentos que utilizam água, nomeadamente máquinas de lavar loiça, máquinas de lavar roupa, torneiras, chuveiros, e equipamento sanitário.
    2. Indicação, em etiqueta visível ao consumidor final, da pegada hídrica relativa a produtos com elevado consumo de água na respetiva produção.
    3. Certificado de eficiência hídrica em edifícios para uso residencial ou comercial, sendo obrigatório um nível mínimo de eficiência para novas construções.
  2. Introdução de uma fiscalidade “verde”, que favoreça o menor consumo doméstico e uma maior reutilização da água doméstica
    1. Criação e aplicação de uma taxa de ineficiência hídrica aos equipamentos com baixo nível de eficiência hídrica, de forma a promover a aquisição daqueles com elevada eficiência (nomeadamente os acima referidos).
    2. Redução do IVA para a taxa reduzida de 6% na aquisição e instalação de equipamentos de reciclagem e aproveitamento de águas cinzentas, bem como para os de captura e tratamento de águas pluviais, tendo em vista a reutilização para fins domésticos.
  3. Incentivar o investimento empresarial na eficiência hídrica
    Apoio ao investimento na eficiência hídrica recorrendo a Fundos Comunitários e ao Fundo Ambiental, bem como permitindo a amortização acelerada de investimentos para:
    • Melhoria de eficiência hídrica na agricultura
    • Instalação de equipamento comercial ou industrial de elevada eficiência hídrica
    • Melhoria de processos industriais
    • Software de gestão de água
  4. Incentivar a reutilização de águas residuais das ETAR e de águas pluviais tratadas, utilizando-as para os fins adequados tendo em conta o respetivo nível de tratamento
    1. Apoiar os investimentos das ETAR em tratamento de água que permita a sua utilização para nomeadamente rega, lavagem de ruas e usos industriais, evitando assim a necessidade de utilizar água potável.
    2. Apoiar os investimentos municipais1 na construção de redes secundárias para a distribuição das águas recicladas, em particular nos municípios mais afetados pela seca (que tenham ligação adequada a uma ETAR com reciclagem de água), bem como para sistemas de captura e tratamento de águas pluviais.
  5. Introdução de incentivos e de penalizações aos municípios com elevado nível de perdas de água na distribuição em baixa
    1. Incentivo ao investimento na renovação da rede de distribuição em baixa através da concessão de empréstimos de longo prazo pelo Estado Central aos municípios com elevados níveis de perdas. Até 20% do empréstimo não será reembolsável, sujeito ao cumprimento de objetivos de redução de perdas.
      Estes investimentos municipais deverão ser apoiados por fundos comunitários, e por cofinanciamento do Estado Central
    2. Deverá ser ainda criada uma penalização no custo da água em alta adquirida pelos municípios relativa a “a água não faturada excessiva” (acima dos 35% de perda), que não pode ser repercutida ao consumidor final. Esta penalização não seria aplicável para os municípios com redução de perdas superior a 2 pontos percentuais face ao ano anterior.
    3. Desta forma, dotam-se os municípios de condições financeiras para fazer os investimentos necessários, bem como se reforça a necessidade desse investimento.

D. Questões Frequentes

A água tratada poderá ser utilizada para rega na Agricultura?

O princípio geral é que a Água deve ser reutilizada com os fins compatíveis com o nível de tratamento a que foram sujeitas, considerando ainda o custo de tratamento e os riscos para a saúde pública. A reutilização da água para a irrigação agrícola deverá naturalmente estar sujeita aos mais elevados padrões de segurança, pelo que exigirá também um maior nível de tratamento da água.
Não sendo de excluir totalmente a utilização agrícola, em particular nas culturas em que tal uso seja considerado mais seguro, considera-se que nesta fase se deverá dar prioridade aos usos que não exigirão um nível de tratamento tão elevado. Uma vez esgotados esses usos, então a reutilização para fins agrícolas deve ser considerada.

Porque é que se cria uma penalização para os municípios com elevado nível de perdas? Porquê apenas acima dos 35%?

Portugal enfrenta frequentemente períodos de seca. Ao apresentarem elevados níveis de perdas de água, alguns municípios estão a desperdiçar água que poderia ser utilizada para reduzir os efeitos da seca. É essencial assegurar que a água não é desperdiçada e é utilizada para os fins mais adequados. Assim, estes municípios estão a criar uma externalidade negativa (menor disponibilidade de água) que deverá ser imputada a quem a gera.
Embora alguma dessa água não corresponda a perdas efetivas, mas antes a água não faturada, isso significa que os utilizadores finais – para além de não contribuírem para pagar o custo que geram no sistema – não têm um incentivo à adequada preservação da água a que têm acesso. Ao assegurar que todos pagam pela água, asseguramos que todos têm o cuidado de a preservar.
É ainda uma realidade que muitos destes municípios têm limitações ao nível dos recursos financeiros de que dispõe para fazer os necessários investimentos. Assim, as medidas foram desenhadas de forma a permitir que municípios que aproveitem os apoios criados para o investimento na rede, e que consigam reduzir as perdas, sejam dispensados do pagamento da penalização.
Mesmo o mais perfeito dos sistemas de distribuição de água em baixa apresenta algum nível de perdas. Colocou-se a fasquia nos 35% de forma a focar a penalização nos casos em que os níveis de perdas são muito superiores à média nacional. No futuro, este valor poderá ser ajustado para os 30% ou 25%.