Supervisão integrada e robusta do sistema financeiro

Supervisão integrada e robusta do sistema financeiro

A. Objetivos

  1. Promover a estabilidade financeira, através da promoção da confiança no regular funcionamento, em contínuo do sistema financeira

B. Racional

  1. A crise económica e financeira de 2007-2008 teve um forte impacto em Portugal. O Estado Português só não ficou insolvente porque foi resgatado por parceiros europeus e internacionais, que, em troca de se tornarem credores do Estado Português, pediram a implementação de um rigoroso, mas necessário, programa de ajustamento.
  2. O setor bancário português sobreviveu à crise, mas apenas após a aplicação de um regime de recapitalização pública a vários bancos importantes e a resolução de um dos maiores bancos portugueses, o Banco Espírito Santo, e do BANIF, um banco com uma importância regional muito importante na Madeira.
  3. A primeira responsabilidade para os problemas dos bancos é dos próprios bancos. Mas as crises bancárias mostraram também deficiências no sistema de supervisão que urge corrigir, em prol da estabilidade financeira portuguesa.
  4. As alterações a introduzir devem ter em conta a existência do Sistema Europeu de Supervisão Financeira e a União Bancária, reduzir a burocracia e criar um sistema institucional simples, de fácil apreensão e com a escala e a capacidade de intervenção necessárias para, de facto, cumprir o seu papel.

C. Proposta

  1. A manutenção do Banco de Portugal enquanto autoridade macroprudencial e autoridade designada para aplicação de reservas macroprudenciais, no contexto do Sistema Europeu de Supervisão Financeira e do Mecanismo Único de Supervisão, bem como revisão e atualização dos seus estatutos.
  2. Fundir as competências do Banco de Portugal, da CMVM e da ASF relativas numa única Entidade Reguladora do Setor Financeiro, uma autoridade administrativa independente a funcionar junto do Banco de Portugal, que congregaria as atribuições e à supervisão do setor financeiro, incluindo a supervisão de conglomerados financeiros, e que seria a autoridade nacional competente para efeitos do Mecanismo Único de Supervisão.
  3. A Entidade Reguladora do Setor Financeira substituiria ainda o Banco de Portugal enquanto autoridade de resolução, sendo a autoridade nacional de resolução para efeitos do Mecanismo Único de Resolução.
  4. Congregação do Fundo de Garantia de Depósitos e do Fundo de Resolução num único fundo, sem personalidade jurídica, a funcionar junto da Entidade Reguladora do Setor Financeiro, com uma comissão diretiva designada por esta entidade.
  5. O reforço dos requisitos de adequação para o exercício de funções no Banco de Portugal e o estabelecimento de requisitos análogos para a Entidade de Regulação do Setor Financeiro, incluindo requisitos de adequação individuais (idoneidade, qualificação profissional e independência), mas também requisitos de adequação coletiva (ao nível das qualificações e da diversidade) dos órgãos de administração e de fiscalização.
  6. Seleção dos membros dos órgãos de administração e fiscalização do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro através de concursos internacionais, organizados pelo próprio Banco de Portugal, com base em avaliações das necessidades do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro ao nível do seu órgão de administração e do seu órgão de fiscalização;
  7. Do referido concurso internacional sairiam três nomes, que seriam apresentados à Assembleia da República/Governo, sendo o Governador e os membros do órgão de administração, bem como os membros do órgão de fiscalização, designados por resolução do Conselho de Ministros.
  8. Estabelecimento de requisitos mínimos legais de governo societário e organização interna para o Banco de Portugal e para a Entidade Reguladora do Setor Financeiro em linha com as melhores práticas internacionais.
  9. O estabelecimento de um mandato único de sete anos para o exercício de funções no Banco de Portugal e na Entidade Reguladora do Setor Financeiro.
  10. O estabelecimento de períodos de nojo legais de dois anos para o exercício de funções dentro da área de atuação do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro.
  11. Reforçar os poderes do Tribunal de Contas relativamente à supervisão financeira do Banco de Portugal, dentro dos limites impostos pelo Banco Central Europeu.
  12. Estabelecimento de um Conselho de Ética do Banco de Portugal, responsável por matérias relativas à ética no Banco de Portugal.
  13. Estabelecimento de uma comissão independente responsável por propor a remuneração dos membros dos órgãos de administração e de fiscalização do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro.
  14. Criar obrigações legais de publicação pelo Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro de documentação relevante para a prestação de contas, incluindo relatórios de atividade, relatórios e contas, atas das reuniões dos respetivos órgãos de administração e fiscalização, e código de conduta e demais normativos internos relativos a ética, aplicáveis aos colaboradores das referidas entidades, em linha com as melhores práticas internacionais.
  15. A extinção do Conselho Nacional de Supervisores Financeiros.

D. Questões Frequentes

Porquê manter o Banco de Portugal como autoridade macroprudencial?

As melhores práticas internacionais apontam para a importância de conferir ao banco central uma posição muito importante do ponto de vista da tomada de decisão macroprudencial, dado o seu conhecimento sobre o setor financeiro como um todo e a sua experiência do ponto de vista do estudo e da promoção da estabilidade financeira. É isto que recomenda também o Comité Europeu de Risco Sistémico, no que tem sido secundo pelo BCE. A dimensão do mercado português não justifica a multiplicação de entidades, com a inerente complexificação do sistema, apontando, desta forma, para a manutenção do banco central como autoridade macroprudencial.

Porque não manter o sistema tripartido atualmente existente?

O sistema financeiro funciona hoje numa lógica de grupos, que exercem a sua atividade em diversos setores simultaneamente. Por outro lado, a complexidade do sistema financeiro atual torna difícil delinear claramente, por setor, o tipo de produtos e serviços prestados, sendo possível a uma seguradora, por exemplo, apresentar aos seus clientes produtos muito parecidos com depósitos e, por outro lado, e dando outro exemplo, é possível a um banco vender seguros ou valores mobiliários. Uma lógica de supervisão integrada permite ter em devida conta a realidade do sistema financeiro atual, impedindo a criação de zonas cinzentas do ponto de vista da supervisão, e desta forma permitindo uma supervisão mais robusta.

Porquê criar a Entidade Reguladora do Setor Financeiro junto do Portugal nos termos propostos, e o que é que isso significa na prática?

A Entidade Reguladora do Setor Financeiro teria a escala necessária para lhe permitir a supervisão integrada e robusta necessária para promover a estabilidade do sistema financeiro português, no contexto do Sistema Europeu de Supervisão Financeira e da União Bancária, sem multiplicar autoridades públicas desnecessárias. Ao separar a supervisão para uma entidade autónoma, aumentaria a independência na prossecução da respetiva função, em linha com as melhores práticas internacionais e com as recomendações do BCE ao nível da relação entre a função de autoridade monetária e da função de autoridade de supervisão, ao mesmo tempo que permitiria ao Banco de Portugal continuar a financiar esta função regulatória. A Entidade Reguladora do Setor Financeiro teria ainda um estatuto de independência reforçado, que lhe permitiria salvaguardar a sua independência face ao poder político e a interesses privados.

Porque não separar a supervisão microprudencial da supervisão comportamental?

Embora tendo perspetivas diferentes, a supervisão microprudencial e a supervisão comportamental têm de funcionar de forma harmoniosa. Por outro lado, as duas questões estão interligadas: os temas prudenciais têm impacto nos comportamentos adotados perante clientes de retalho, e os comportamentos adotados perante clientes de retalho têm impacto prudencial. Assim, importa fomentar que a supervisão microprudencial e comportamental sejam prosseguidas de forma sinergística, o que é melhor conseguido se forem prosseguidas pela mesma entidade.

Porquê manter a resolução com a supervisão?

A informação obtida pela supervisão pode ser relevante do ponto de vista da resolução, e vice-versa. Existem sinergias entre o acompanhamento da entidade em vida e da preparação da sua possível morte.

Porquê manter a resolução numa entidade dedicada à supervisão integrada do setor financeiro quando apenas existe resolução no setor bancário?

Embora neste momento o regime de resolução vigente seja aplicável a bancos e a certos tipos de empresas de investimento, já é discutida a possibilidade da criação de um sistema de resolução aplicável a entidades seguradoras.

Porquê criar mandatos únicos e períodos de nojo legalmente definidos?

Para aumentar o grau de independência dos membros dos órgãos de administração e fiscalização das entidades em causa. Mandatos longos e únicos significam que a pessoa se pode focar na sua tarefa, sendo menos permeável a ciclos políticos. As existências de períodos de nojo mínimos legalmente definidos servem para combater conflitos de interesses, ao impedir que alguém passe de imediato de uma atividade regulatória para uma atividade regulada.

O que são requisitos de adequação individuais e coletivos para os membros dos órgãos de administração e fiscalização, e qual a sua importância?

Os requisitos de adequação são critérios para a seleção dos membros dos órgãos de administração e fiscalização de uma determinada entidade. Os requisitos individuais são critérios aplicáveis às pessoas individualmente consideradas. Os requisitos coletivos são critérios aplicáveis aos órgãos. A seleção das pessoas deve ser precedida de uma avaliação das necessidades concretas da organização. Em especial, deve assegurar-se, por um lado, que se dispõe de pessoas honestas, éticas e de confiança, com as qualificações necessárias e sem conflitos de interesses. Por outro, deve assegurar-se que os órgãos, coletivamente, dispõem de pessoas que permitam ao órgão deliberar, de forma informada, sobre todas as matérias que lhe possam ser apresentadas, atendendo às especificidades da organização. Assim, um órgão formado exclusivamente por juristas ou por economistas, por exemplo, todos eles provenientes da mesma universidade, tenderia, provavelmente, a, por um lado, levar a pensamento grupal e, por outro, a levar a falta de conhecimento em matérias relevantes. Importa assegurar, portanto, diversidade, que promova a existência debates profícuos e a efetiva colegialidade das decisões.

Seria mantido o exercício de funções no Banco de Portugal em regime de exclusividade? O mesmo regime seria aplicável à Entidade Reguladora do Setor Financeiro?

O exercício de funções no Banco de Portugal e na Entidade Reguladora do Setor Financeiro seria o da exclusividade, com exceção do revisor oficial de contas.

Porquê criar um conselho de ética do Banco de Portugal? Quem integraria este conselho?

As matérias éticas assumem um papel de tal forma relevante que requerem um tratamento especializado ao mais alto nível, por pessoas que possam ter uma postura crítica inclusivamente perante os órgãos de administração e fiscalização. O conselho de ética seria integrado em exclusivo por pessoas independentes, designadas pelo conselho de auditoria do Banco de Portugal.

Porquê criar uma comissão independente para definir as remunerações dos membros dos órgãos de administração e fiscalização do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro?

As remunerações dos membros dos órgãos de administração e fiscalização são importantes fontes de incentivos. Entende-se que as remunerações do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro devem ser comensuráveis às responsabilidades e aos riscos inerentes ao exercício da atividade de membro dos seus órgãos de administração e de fiscalização. Assim, propõe-se que a definição das remunerações deve ser estabelecida por pessoas independentes, designadas pelo conselho de auditoria para uma comissão de remunerações, com base em critérios que tenham em devida conta as especificidades do Banco de Portugal e da Entidade Reguladora do Setor Financeiro.