Num tempo em que 75% das pessoas têm acesso à internet e toda a população pode ver televisão, financiar comícios, jantares e brindes só serve para os partidos distribuirem benesses aos seus seguidores
Há três formas essenciais de divulgar a mensagem política: internet, televisão e cartazes de rua. A divulgação através da internet é essencialmente gratuita. A parte que não seria gratuita – o pagamento por publicidade online – está proibida em períodos de campanha, pelo que a subvenção não pode ser usada para isso. O dinheiro da subvenção também não pode ser utilizado para comprar espaços televisivos. Os tempos de antena são gratuitos e o estado ainda permite que os partidos gravem esses tempos de antena nos estúdios da RTP sem qualquer custo adicional. Ou seja, a subvenção para campanhas não servirá para divulgar a mensagem através da internet ou da televisão, os dois meios essenciais para o fazer. Restam os cartazes. Mas mesmo aqui a lei do financiamento partidário apenas permite que 25% da subvenção de campanha seja gasta em cartazes. Para que possam receber mil euros para divulgação da mensagem através de cartazes, os partidos têm que gastar mais 3 mil euros noutro tipo de despesa de campanha.
Se não servem para financiar os principais meios de divulgação de mensagem política, para que servem então as subvenções de campanha? Para festas, comícios, jantares, sedes de campanha e brindes. Nenhuma destas despesas tem o propósito de fazer passar mensagem política. Quem conhece minimamente a forma como decorrem eventos partidários, sabe que eles servem para tudo menos para passar mensagem política. As pessoas que os frequentam são maioritariamente militantes ou simpatizantes, pessoas já convencidas. Os partidos chegam mesmo a transportar militantes de outras zonas do país para encher comícios para as câmaras de televisão. Tanto o comício como o transporte dos militantes podem ser declaradas como despesas de campanha e pagas pelos contribuintes. Os jantares, brindes e viagens de autocarro pagos pelas subvenções de campanha não são formas de fazer política, são prémios de lealdade que cada cacique local dá aos militantes locais e às juventudes partidárias para que continuem a fazer o seu trabalho.
Mesmo que essas despesas servissem para passar mensagem política, as regras de atribuição da subvenção para campanhas eleitorais fazem com que o dinheiro apenas chegue aos partidos grandes, ou seja, os que já têm atenção mediática suficiente para que a sua mensagem política passe facilmente de qualquer forma. Se em vez do atual sistema, fossem atribuídos 20 mil euros a cada partido concorrente com a única condição de serem utilizados na divulgação da mensagem política, não só a subvenção seria mais efetiva na promoção da democracia, como custaria menos de um décimo aos contribuintes do que atualmente. Em vez disso, os partidos do regime criaram um conjunto de regras para garantir que a subvenção de campanha é usada para financiar as atividades dos grandes partidos e para organizar jantaradas de militantes à custa dos contribuintes.
A lei do financiamento dos partidos foi desenhada para uma realidade diferente, de quando o acesso à informação era bastante mais difícil do que é hoje. Numa altura em que 75% das pessoas têm acesso à internet e virtualmente toda a população tem acesso a televisão, pensar que financiar comícios, jantares e brindes é essencial à democracia é uma ficção criada para que os partidos políticos continuem a distribuir benesses entre os seus seguidores à custa dos contribuintes.
Esta é uma discussão que poucos querem ter. Os partidos que hoje beneficiam desta imoralidade não têm qualquer incentivo a acabar com ela. Aqueles que ainda não beneficiam dela, ficam calados à espera de poderem vir a beneficiar um dia. Os recém-chegados Aliança e Basta, por exemplo, orçamentaram despesas suficientes para poderem vir a receber a subvenção se elegerem um deputado europeu. É perfeitamente defensável beneficiar de algo com que não se concorda, desde que em igualdade de circunstâncias com os outros. Mas no caso das subvenções de campanha, o roubo ao contribuinte é tão descarado que só há um caminho possível: não aceitar receber um euro de subvenção de campanha e lutar por mudar a lei. Enquanto for presidente do partido Iniciativa Liberal não aceitaremos um euro de subvenção de campanha. Até a lei mudar e acabar com esta imoralidade, é fundamental não ser conivente com ela.
Carlos Guimarães Pinto, Presidente do partido Iniciativa Liberal
OBSERVADOR, 23 de Abril de 2019