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Definição de um plano de ação para revitalizar a gestão dos hospitais públicos

OBJETIVOS

  • Aumentar a transparência em relação aos critérios que sustentam as decisões em relação aos modelos de gestão a implementar nos hospitais públicos e garantir que os mesmos são suportados em indicadores de qualidade e de custo-benefício, abordagem essencial para a sustentabilidade do SNS e aplicação dos fundos públicos.
  • Definir um plano de ação com objetivos mensuráveis, medidas concretas e um cronograma claro de médio prazo, para melhorar a gestão dos hospitais públicos, em três pilares-chave: a qualidade da prestação de cuidados de saúde, a aplicação eficiente dos recursos financeiros do estado e a valorização dos profissionais de saúde.
  • Garantir a autonomia dos conselhos de administração dos hospitais e demais unidades de saúde na gestão hospitalar, pelo menos, das necessidades de curto-prazo.

PROPOSTA

  • Estudar o impacto dos processos de reversão dos hospitais de Braga, Vila Franca de Xira e Loures na gestão hospitalar assim como nos indicadores de qualidade e eficiência.
  • Retirar da Lei de Bases da Saúde a exigência ideológica de que a gestão privada dos hospitais públicos tem de ser “excecional”, “supletiva” e “temporária”, o que não é razoável quando:
    • Nos últimos 20 anos, vários hospitais foram geridos em PPP com elevados índices de satisfação dos utentes, que não diferenciam na sua utilização uma gestão privada de pública.
    • As entidades fiscalizadoras evidenciam que as PPP estão plenamente integradas no SNS.
  • Clarificar o plano do SNS para a criação de PPP em 2022-2025 e tornar pública a matriz de critérios que determina a escolha entre optar pela gestão de um hospital público através de uma PPP ou de uma EPE.
  • Voltar a colocar a principal decisão das PPP no Ministério das Finanças e da Saúde e não no Conselho de Ministros.
  • Exigir a implementação das recomendações do Tribunal de Contas dirigidas ao Ministro da Saúde, e às entidades auditadas, para a necessidade de serem realizados inquéritos de satisfação dos utentes de todas as unidades hospitalares do SNS e de desenvolver indicadores de desempenho comparáveis aos apurados nas PPP, por forma a permitir a comparação entre os hospitais geridos em PPP e os restantes hospitais do SNS, e a clarificar os utentes do SNS sobre a valia relativa dos dois modelos de gestão.
  • Promover a disponibilização pública, no portal da transparência do SNS, de todos os indicadores de desempenho dos hospitais públicos por forma a permitir o escrutínio do público e da academia, com a melhoria continua dos indicadores e o reforço de investigação científica na área.
  • Terminar com a prática de financiamento dos hospitais por aumentos de capital.
  • Apresentar à Assembleia da República os desvios de execução da despesa apresentando, caso seja necessário, os respetivos Orçamentos Retificativos.
  • Contratualizar a produção com todos os hospitais públicos de forma a implementar medidas que garantam a flexibilidade nos Conselhos de Administração de decisões com impacto crítico na gestão hospitalar, promovendo a sua autonomia na renovação de equipamentos e contratação ou avaliação de profissionais de saúde, com a devida responsabilidade e escrutínio, por exemplo através:
    • De um orçamento de reserva para utilização excecional, mas discricionária, sujeito a revisão anual mediante o impacto e os resultados da sua utilização.
    • De condições contratuais e incentivos específicos para a contratação de médicos para os serviços de urgência, evitando recorrer a tarefeiros a um custo bastante mais elevado e sem a mesma coesão e integração com as equipas do serviço.
  • Promover procedimentos de concursos para transformar em PPP:
    • Os hospitais públicos em que há evidência histórica e benchmark entre a gestão do hospital como EPE ou PPP na última década que demonstre inequivocamente benefício para o Estado e utentes (Braga, Loures e Vila Franca de Xira) de ser uma PPP.
    • Os hospitais públicos em cada grupo de benchmark com o gasto operacional por doente padrão mais elevado em relação aos seus pares, atendendo à eficiência obtida no modelo de PPP.
  • Estabelecer o prazo mínimo para os contratos de gestão, privilegiando a rotatividade da gestão das infraestruturas do Estado e garantindo aos colaboradores, utentes e à entidade gestora um período minimamente razoável de estabilidade.
  • Estabelecer uma comissão independente que possa renegociar os critérios para a celebração de novos contratos de gestão em regime PPP e a sua contratualização, garantindo que constituem uma mais-valia para todas as partes: o Estado, entidades gestoras e utentes, utilizando como referência para os acordos de produção estudos de projeção futura e incorporando as variáveis que nestas impactam como, por exemplo, a demografia da população abrangida, a incidência de doenças crónicas, a capacidade de resposta de zonas adjacentes ou os novos tratamentos a serem implementados.
  • Permitir que as PPP, tal como acontece nos Hospitais Públicos, possam acautelar as novas linhas de produção que vão mudando ao longo de um período de 7 anos, alterando a produção acordada automaticamente em conformidade, com base num conjunto de critérios e indicadores exógenos a acordar.

RACIONAL

O SNS está em rutura mesmo fora de períodos de maior procura, sem autonomia e enfraquecido segundo os profissionais de saúde e a Ordem dos Médicos

A situação nos hospitais públicos continua a ser crítica depois de ultrapassado o pico da pandemia, com falta de recursos humanos e financeiros, pessoal desmotivado e sistemas de gestão pouco eficientes.

O Hospital de Setúbal é um bom exemplo conforme relatado pelo diretor clínico em outubro de 2021 ao alertar para a rutura nos serviços de urgência, blocos operatórios, oncologia, maternidade ou anestesia. A ausência de anestesistas impede a recuperação das cirurgias atrasadas e a máxima utilização da capacidade instalada nos blocos operatórios, e, por outro lado, as especialidades de ginecologia, oncologia ou pediatria estão em risco de encerramento1, com os profissionais de saúde exaustos e a demissão do diretor clínico e dos restantes 86 responsáveis de equipa. A resposta do Ministério da Saúde foi anunciar a contratação de 10 médicos especialistas2, naturalmente insuficiente e sem qualquer impacto nos sistemas de gestão.

O Hospital de Leiria também em outubro de 2021 já se encontrava numa situação semelhante, sem capacidade de resposta3. Em ambos os casos de Setúbal e Leiria, a Ordem dos Médicos afirmou que “é um retrato fiel do Serviço Nacional de Saúde” e o bastonário reiterou que o SNS tem “de se tornar concorrencial com o setor privado da saúde e com outros países da União Europeia”4 para conseguir reter os seus médicos.

Já em Novembro, no hospital de Santa Maria, uma referência nacional e em Lisboa, os dez chefes da equipa de urgência cirúrgica demitiram-se devido às exigências de horas extraordinárias nas escalas do serviço e à falta de pessoal5

A realidade é que os médicos estão a desistir do SNS. Apenas 53% dos médicos inscritos na ordem trabalham no SNS6 e entre fevereiro de 2019 e julho de 2021, o número de portugueses sem médico de família quase duplicou.

Na avaliação ao OE para 2020 a UTAO destaca ser “evidente para observadores externos que os estrangulamentos na gestão da generalidade das unidades (…) do SNS não se resume à insuficiência de dotações” apontando que o sistema de saúde “é demasiado grande e complexo para concentrar no poder político tantos atos de gestão que deveriam estar descentralizados, com responsabilização pelos resultados, nos conselhos de administração”.

SNS mantém-se incapaz de garantir o acesso das pessoas à saúde

O défice acumulado no seguimento de doentes desde o início da pandemia que tem contribuído para os excessos de mortalidade não COVID e para o aparecimento de doentes em fase muito mais avançada do que seria de esperar num bom sistema de saúde não coaduna com o sistema universal de saúde previsto na constituição, com a atual lei de bases (ponto 1 alínea b da base 2: “a aceder aos cuidados de saúde adequados à sua situação, com prontidão e no tempo considerado clinicamente aceitável, de forma digna”) e acima de tudo com a mais básica humanidade e promoção da dignidade da vida humana.

A suborçamentação do SNS oculta o seu real custo para o Estado e torna-o um doente crónico que entra e sai dos cuidados intensivos

Suborçamentação: O relatório7 de apreciação da Conta Geral do Estado em 2019 da Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) já era claro: o governo suborçamenta o SNS e corrige os desequilíbrios com injeções de capital regulares que pretendem mitigar o incumprimento dos rácios mínimos de solvabilidade e os pagamentos em atraso a fornecedores. Mas não é apenas um desfasamento temporal porque estes atrasos, por exemplo, “causam preços mais elevados nos bens e serviços adquiridos pelo SNS”. É uma forma de controlo centralizado de um SNS que não tem sistemas de gestão e controlo da despesa eficientes para poder ser gerido de forma descentralizada como a sua complexidade exige.

Centralização: Citando o relatório da UTAO, “a gestão dos estabelecimentos do SNS é ainda condicionada por uma centralização excessiva, na tutela sectorial e no Ministério das Finanças, de decisões que deveriam ser tomadas na esfera de autonomia dos conselhos de administração, como sejam a contratação de pessoal e a panóplia de atos de gestão corrente que carecem de autorização política morosa e sujeita a elevada burocracia. Sem uma correção estrutural e integrada de todas estas dimensões, os estrangulamentos na atividade assistencial continuarão a ser uma realidade para utentes, trabalhadores, gestores e fornecedores”.

Através da centralização de mecanismos de controlo e aprovação prévia nas tutelas setoriais e da área das Finanças, pretende-se conter o crescimento no volume de trabalhadores e o recurso à utilização de serviços prestados por entidades externas, mas de acordo com a UTAO, “há uma clara desproporcionalidade entre o esforço exigido para obter as autorizações e a materialidade da despesa em causa”. Reitera também que “os pesados processos administrativos não são escalados em função do volume de trabalhadores que se pretende contratar nem do valor das adjudicações de serviços que se deseja realizar”.

Contabilidade criativa e cativações: Note-se que este centralismo e mecanismo de repressão da despesa não é feito pelo Ministério da Saúde, mas pelo Ministério das Finanças, através de injeções de capital nos Hospitais do SNS. Pode parecer um detalhe, mas desta forma, o reforço da receita em saúde (i) não é controlada pelo ministério da tutela e (ii) não entra nas contas regulares do SNS, mas (iii) na aquisição de ativos financeiros do Ministério das Finanças – afastando assim a necessidade de registar um desvio orçamental num eventual orçamento retificativo. A opacidade é total, já que se afasta um acompanhamento da execução orçamental da Assembleia da República e demais organismos fiscalizadores dos gastos do estado. Ou seja, na prática há uma forte repressão da despesa no SNS (500 milhões) que não surge nos números de execução orçamental.

Falta de vontade política: Na avaliação do OE para 2020, elaborado em 2019, antes de surgir a dimensão Covid, que tem sido a justificação para a ausência de várias reformas, e quando se anunciava o reforço do SNS, a UTAO afirmava que “o reforço do financiamento para a despesa efetiva do programa orçamental da Saúde e, em particular, do SNS não satisfaz os critérios necessários para ser classificado como uma medida com impacto orçamental correspondente a uma mudança de orientação política”.13

Reversões de PPP indiciam degradação da gestão hospitalar e menor autonomia

Apenas após 6 meses de gestão por EPE, a Ordem dos Médicos evidencia diferenças significativas em relação à gestão em PPP como “escusas de responsabilidade e insuficiências de serviços”, reforçando ser algo a “que não estávamos habituados neste hospital”14 e apontando como causa a menor autonomia de decisão e contratação, com impacto direto na capacitação de médicos e equipamentos em tempo útil.

No Hospital de Braga, também ex-PPP, 9 dos 16 chefes de equipa de urgência demitiram-se pela falta de médicos que é suprida com recurso a tarefeiros, mais uma vez pela incapacidade dos sistemas de gestão de tomar decisões e contratar em tempo útil.15

As entidades oficiais de fiscalização concluem que PPP prestam melhor serviço a todas as partes e são mais eficientes do que os hospitais geridos por EPE

Melhor gestão dos recursos financeiros: O Tribunal de Contas e a Entidade Reguladora da Saúde reiteram sucessivamente nos seus relatórios de acompanhamento que a prestação de cuidados de saúde pelos operadores privados é de boa qualidade, os recursos humanos usufruem de condições de trabalho e planos de carreira melhores e existe uma melhor gestão dos recursos financeiros.

Segundo a Unidade Técnica de Acompanhamento de Projetos do Ministério das Finanças e da Saúde (UTAP), os hospitais em regime de Parceria Público-Privada (PPP) “estão plenamente integrados no SNS e geraram poupanças para o Estado entre 2014 e 2019 no valor de 203 milhões de Euros”, valores que inclusivamente tendem a ser superiores pelo facto de apenas ter sido analisada parte da execução dos contratos de gestão.

A UTAP reforça também que “as PPP hospitalares foram genericamente mais eficientes do que a média dos hospitais de gestão pública comparáveis e estiveram alinhadas com o desempenho médio quanto a indicadores de qualidade, eficácia e acesso”.

A nível de eficiência, em 2018, as PPP dos Hospitais de Braga (€2.280), de Loures (€2.815) e de Vila Franca de Xira (€2.859) apresentaram os três mais baixos custos operacionais por doente padrão apurados, posição consistentemente ocupada pela PPP de Braga desde 2013.

Melhor gestão do ponto de vista da qualidade do serviço: A avaliação do desempenho das PPP na componente da gestão hospitalar foi positiva, “quer na ótica do Estado, entidade contratante, quer na ótica das avaliações externas independentes por ele promovidas” e sobretudo quanto à qualidade do serviço “os utentes dos hospitais geridos em PPP estão protegidos por padrões de qualidade mais exigentes do que os aplicados na monitorização dos hospitais de gestão pública”.

Uma das razões é o facto das entidades gestores estarem obrigadas à implementação de sistemas de gestão da qualidade que incluem vertentes como a acreditação anual dos hospitais por entidades internacionais certificadas.

Utentes mais satisfeitos: Além da qualidade, também a satisfação dos utentes é essencial. A auditoria às PPP publicada em 2021 pelo Tribunal de Contas evidencia que, desde 2010, o Ministério da Saúde não tem apurado indicadores de satisfação dos utentes destes hospitais, que permitissem compará-los com os níveis de satisfação dos utentes dos Hospitais do SNS geridos em PPP.

As lacunas das PPP não justificam a sua reversão e derivam da rigidez na gestão dos contratos e da subcontratação nos acordos de produção

Os acordos de produção nos contratos de gestão preveem que, caso as partes não estejam de acordo nas previsões de produção, prevalece a utilização hospitalar dos cinco anos anteriores, quando a atividade de saúde tem vindo a aumentar por diversos fatores como a incidência de doentes crónicos, o peso da população envelhecida, entre outros.

Mesmo assim, no caso dos Hospitais de Loures e de Braga, apesar dos acordos alcançados quanto à produção a realizar, foram identificadas situações em que a produção acordada foi inferior à que resultaria da aplicação das regras contratuais, que obrigariam à consideração do histórico da atividade hospitalar e dos seus resultados, “[…] sobretudo quando daquela hajam resultado listas de espera”.

As novas linhas de produção que surgem na atividade hospitalar não são em alguns casos atualizadas no decorrer dos contratos, o que impede as PPP de acederem ao financiamento previsto para essas linhas e exigem assim que as entidades gestoras assumam um prejuízo para manterem a prestação de cuidados de saúde a certos grupos de doentes.

Num SNS insustentável a relação custo-benefício é essencial na tomada de decisão quanto à gestão hospitalar

Está prevista a manutenção de 2 PPP para os hospitais de Cascais e Lisboa Oriental, no entanto, não há evidência de critérios claros e quantitativos que permitam explicar a estratégia do SNS para as PPP e as razões que motivam estas parcerias ou, pelo contrário, a escolha por outras alternativas.

Um dos desafios para os próximos anos evidenciado pela Auditoria do Tribunal de Contas é mesmo a “fundamentação da escolha entre a contratação pública tradicional e as PPP, em análises custo-benefício, por forma a garantir a melhor aplicação dos dinheiros públicos para a satisfação de necessidades coletivas, em observância dos princípios da economia, da eficiência e da eficácia da despesa pública”.

QUANTIFICAÇÃO

A auditoria do Tribunal de Contas aos resultados aprovados entre 2014 e 2019 estima que a poupança total estimada, para as 4 PPP, ascendeu a € 671M, em resultado de uma poupança de € 716M prevista para a vertente da gestão dos estabelecimentos hospitalares e de uma deseconomia de € – 45M prevista para a construção e gestão dos edifícios.

Segundo o relatório desta auditoria, o estado poupou em 6 anos pelo menos 203 milhões de Euros com as PPP de Braga, Vila Franca de Xira, Loures e Cascais, tendo provavelmente sido superior se for analisado todo o período dos contratos. Para colocarmos em perspetiva, a despesa prevista para o futuro Hospital Central do Alentejo no Orçamento de Estado para 2021 foi de 150 milhões de euros.

Em 2018 apurou-se que caso as unidades do Serviço Nacional de Saúde reduzissem o custo por doente padrão ao valor mais eficiente, o Serviço Nacional de Saúde podia poupar 727 milhões de euros por ano.16

QUESTÕES FREQUENTES

“Quando algo corre mal nestas parcerias o risco é sempre para o público e não para os privados”, havendo sempre “contratos de reequilíbrio financeiro após os contratos iniciais”

Fonte: https://www.esquerda.net/artigo/ppp-sao-um-autentico-sorvedouro-de-dinheiro/66252

O Estado subdimensiona as PPP para um nível de serviço inferior ao necessário, conseguindo poupanças artificiais. Ou seja, a gestão privada tem de ser ainda mais eficiente do que o esperado para conseguir suportar o nível de procura / custo não esperado. Os hospitais em PPP são assim eficientes, mas acabam por ter prejuízo já que a procura não esperada é muito superior ao que conseguem acomodar. Neste caso, por contratação, o risco está mais para o lado privado do que para o público. É por isso essencial ser leal na concessão e no acompanhamento das PPP e permitir flexibilidade na gestão.

As diferentes auditorias do Tribunal de Contas indicam que nos contratos executados entre 2009 e 2019, a produção adicional à prevista “não foi remunerada ou foi remunerada a preços marginais inferiores”. O caso mais gritante terá sido a PPP do Hospital de Braga, em que cerca de 10% de todas as consultas externas médicas realizadas não foram remuneradas. Estes prejuízos têm obrigado os prestadores a procedimentos formais de resolução de litígios, que representam cerca de 61M€ das remunerações acumuladas.

Além disso, quando a gestão corre mal, os hospitais em PPP sofrem penalizações financeiras – mecanismo que já se traduziu na “aplicação de € 43M de deduções às respetivas remunerações, entre 2009 e 2018”.

Mais ainda, as entidades gestoras das PPP não recebem, ao contrário do que acontece com os hospitais de gestão pública, quaisquer financiamentos adicionais que compensem eventuais resultados negativos associados à realização de produção não remunerada ou remunerada a preços marginais inferiores, pelo que os prestadores são forçados a assumir esse risco e custo.

Dois exemplos:

  • A CUF anunciou ter registado prejuízo em 2020, em parte justificado por perdas por imparidade e provisões relacionadas com as PPP de Vila Franca de Xira e Braga[1]. Face a 2019, os rendimentos operacionais consolidados caíram 24% mas se for excluída a atividade de Braga e os efeitos extraordinários em 2019, após terminado o contrato a 31 de agosto desse ano, o recuo homólogo seria apenas de 6,8%.
  • Da mesma forma, o grupo Luz Saúde fechou o ano de 2020 com prejuízos de 16,3 milhões de euros, um valor que compara com lucros de 16,7 milhões registados no ano anterior atribuindo um impacto “determinante” à PPP de Loures nas perdas e apresentou, por isso, um “pedido fundamentado de reequilíbrio financeiro ao Estado”5 .

Há estudos oficiais que chegaram a conclusões diferentes: Tribunal de Contas (2013): “Ainda não existem evidências que permitam confirmar que a opção pelo modelo PPP gera valor acrescentado face ao modelo de contratação tradicional”?

Fonte: https://www.tcontas.pt/pt-pt/ProdutosTC/Relatorios/RelatoriosAuditoria/Documents/2013/rel018-2013-2s.pdf

Essa frase consta do relatório do Tribunal de Contas. Mas não conta toda a verdade. Apesar das cautelas esse mesmo documento indica ainda as vantagens da contratualização e das PPP. O mesmo documento salienta que o Tribunal de contas “constata que existe um maior controlo dos encargos públicos com as PPP das grandes unidades hospitalares, na medida em que existe um processo anual de negociação da produção clínica, controlada pelo concedente de acordo com as necessidades detetadas e a sua disponibilidade orçamental e onde, no limite, o Estado pode determinar, unilateralmente, a produção anual. A concessionária tem, também, alguma salvaguarda, pois o contrato impõe que os limites mínimos verificados nos cinco anos anteriores sejam respeitados. [Sublinhados do próprio TdC]

Sobre a afirmação propriamente dita, é ainda necessário por no contexto: essa conclusão vem no seguimento da conclusão de que o Ministério das Finanças não usa a taxa de desconto adequada, ou seja, e na expressão do TdC, a avaliação do investimento é excessivamente “optimista”. De outra forma, a afirmação não se prende com a gestão em si, mas com a construção de edifícios e com um aspeto muito específico dessa opção.

Há estudos oficiais que chegaram a conclusões diferentes: Em 2014, a auditoria à PPP Cascais admitia que o “desempenho do hospital foi idêntico ao do centro hospitalar de Entre Douro e Vouga”

Fonte: https://www.tcontas.pt/pt-pt/ProdutosTC/Relatorios/RelatoriosAuditoria/Documents/2014/rel011-2014-2s.pdf

Está essa frase, mas o documento não diz apenas isso. Com vista a proceder à comparação do desempenho assistencial da HPP Saúde-Parcerias Cascais, S.A. com outras entidades públicas empresariais do SNS, selecionaram-se:

  • Centro Hospitalar Barreiro Montijo, EPE,
  • Centro Hospitalar Médio Tejo, EPE,
  • Centro Hospitalar Barlavento Algarvio, EPE, que atendendo aos critérios do índice de case-mix (complexidade clínica), número de doentes equivalentes e perfil assistencial teriam idênticas condições de comparabilidade.

Foram ainda selecionados:

  • Centro Hospitalar de Entre Douro e Vouga, EPE,
  • Centro Hospitalar do Tâmega e Sousa, EPE, hospitais que constituíram elemento de comparação aquando do lançamento da parceria.

Ou seja, a PPP de Cascais foi melhor do que as 4 entidades de referência e ficou empatada com a melhor solução do sector público.

Note-se que o sector e a gestão privada (e social) não é melhor por ser melhor. A gestão privada é melhor porque tem objetivos e um plano para o atingir (contratualização) e mecanismos automáticos de. Esses mecanismos podem ser transpostos para a totalidade do SNS – é na prática o que propomos.

Há estudos oficiais que chegaram a conclusões diferentes: c) Na auditoria a Loures (2015): “Não resulta evidente maior eficiência do modelo de gestão privada, face à gestão de outras unidades com gestão pública empresarial do SNS”. Mais: “o financiamento por doente padrão, em 2013, foi mais elevado do que o dos centros hospitalares públicos comparáveis”.

Fonte: https://www.tcontas.pt/pt-pt/ProdutosTC/Relatorios/RelatoriosAuditoria/Documents/2015/rel019-2015-2s.PDF

Mais uma vez, esta afirmação não conta a história toda. O mesmo documento afirma que:

  • “Já em 2013, o hospital produziu mais 3% nesta atividade relativamente ao acordado entre as partes”
  • “A maior complexidade dos doentes tratados tem-se traduzido no apuramento de índices de case mix (complexidade clínica) da atividade hospitalar superiores aos inicialmente estimados para o modelo financeiro (+37% em 2012 e +21% em 2013) e aos estimados na contratação da produção anual pela ARSLVT, situação com reflexo nos custos da atividade e no valor da respetiva remuneração da Entidade Gestora do Estabelecimento”

Ou seja, este hospital fez mais e fez procedimentos mais complexos.

Note-se que o sector e a gestão privada (e social) não é melhor por ser melhor. A gestão privada é melhor porque tem objetivos e um plano para o atingir (contratualização) e mecanismos automáticos de correção – lucros e concorrência. Esses mecanismos podem ser transpostos para a totalidade do SNS – é na prática o que propomos.

Há estudos oficiais que chegaram a conclusões diferentes: Hospital de Braga (2016): “a produção acordada não se tem subordinado às necessidades da população, o que levou ao aumento das listas e tempos de espera”

Fonte: https://www.tcontas.pt/pt-pt/ProdutosTC/Relatorios/RelatoriosAuditoria/Documents/2016/rel024-2016-2s.pdf

Esta é a critica mais interessante já que revela vários detalhes (descritos na auditoria do TdC):

  • A contratualização foi abaixo das necessidades da população;
  • O hospital tratou acima da sua capacidade financeira, estando tecnicamente falido desde 2011;
  • O hospital encaminhou utentes para outros hospitais, nomeadamente na zona do Grande Porto;
  • O custo por utente é o mais baixo do que os hospitais comparáveis.

Ou seja, ao hospital foi-lhes pedido para fazerem mais do que o previsto, coisa que o fizeram – de tal forma que faliram.

Continuando a pedir para fazerem mais, o hospital recorreu-se do resto da rede de saúde, fazendo com que o Estado pagasse em média mais por tratamento.

Resumindo: O contrato foi mal planeado e ao invés de o corrigir, quando as dificuldades apertaram exigiu-se a falência do parceiro e pagou-se mais por cada tratamento.

A contratualização em PPP, com gestão pública ou privada, tem de ser em rede e atender às necessidades da população a um nível integrado. Essa é uma das razões por quais defendemos que o SNS seja organizado por subsistemas concorrenciais – a população tem escolha quando tudo falha, e as poupanças de um prestador são sentidas sempre pelo subsistema convidando a uma sã resolução de problemas.

Referências

1 https://tvi24.iol.pt/sociedade/saude/hospital-de-setubal-faltam-medicos-faltam-condicoes-de-trabalho-sobejam-doentes

2 https://www.dn.pt/sociedade/grito-de-revolta-87-clinicos-apresentam-se-demissao-no-hospital-de-setubal-14194815.html

3 https://www.tsf.pt/portugal/sociedade/situacao-dramatica-acesso-ao-servico-de-urgencia-do-hospital-de-leiria-limitado-14213839.html

4 https://www.jn.pt/nacional/centro-hospitalar-de-setubal-e-retrato-fiel-do-sns-14254839.html

5 https://expresso.pt/sociedade/2021-11-22-Demitiram-se-os-chefes-da-urgencia-cirurgica-do-Hospital-Santa-Maria-em-Lisboa-d6a729a4

6 https://www.dn.pt/sociedade/quase-metade-dos-medicos-trabalha-fora-do-sns-14259825.html

7 https://www.parlamento.pt/sites/COM/XIVLeg/5COF/Paginas/utao.aspx?t=513239756447456752325679595777675a47386752584e3059575276&Path=6148523063446f764c324679626d56304c334e706447567a4c31684a566b786c5a793944543030764e554e5052693942636e463161585a765132397461584e7a59573876565652425479394462323530595342485a584a686243426b62794246633352685a47383d

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